terça-feira, 5 de abril de 2011

Fone de ouvido

Dez para as cinco da manhã meu celular toca Alanis Morrissete, "King of Pain"... Já que é para acordar que seja da melhor maneira que eu puder encontrar... Ok, ok... Podia ser com um sussurro no ouvido de Jared Padalecki, seguido de um abraço e um beijo que ignorasse completamente o meu bafo da manhã, mas meu celular infelizmente não tem essa opção na função do despertador... Acordar com a Alanis cantando já está de bom tamanho.
Então o ritual clássico, comida da Indi e da gatinha, colocar alguma das roupas que nunca vão ficar como eu gostaria, café, sapato, o primeiro Marlboro do dia... E lá vou eu.
Sou uma das primeiras a pegar o fretado, o que é bom e é ruim. Bom porque escolho o lugar que eu achar melhor. Ruim porque se sou uma das primeiras a ser levada é porque também serei umas das últimas a ser deixada. E todos os dias são três horas dentro do ônibus... Indo e voltando do trabalho.
Quanta coisa não acontece em três horas? Em três horas a gente pode mudar a história da humanidade, a gente pode fazer um show no Morumbi para cem mil pessoas, a gente pode encontrar o amor das nossas vidas, a gente pode chegar na praia, cara! Mas não... Lá estou eu indo e voltando do trabalho. E enquanto no fone de ouvido toca minhas músicas preferidas e eu durmo enquanto as ouço ou leio algum livro tudo está certo. O verdadeiro problema é esquecer o fone de ouvido como aconteceu ontem.
Errar é humano, compreensível, perdoável... É normal perder o controle em algumas situações de nossas vidas, magoar alguém com ou sem intenção, perder dinheiro, acreditar nas pessoas erradas... Tudo isso eu posso entender. Mas esquecer o fone de ouvido quando você está viajando junto com a produção da empresa não! Não é compreensível! É imperdoável! E como a lei de Murphy é algo que impera no meu dia-a-dia, justamente ontem mudaram a empresa de ônibus (denovo!) e o novo motorista necessariamente irá mais devagar para aprender o itnerário. Então aquela uma hora e meia se transformará com muita sorte em duas horas, senão duas horas e meia...
E ontem as meninas do tal fundão estavam com muita fofoca pra pôr em dia enquanto eu, pobre de mim, estava de ressaca, com sono, cansada, irritada, sozinha à tarde toda resolvendo os pepinos que apareceram no trabalho... Então a tortura começou logo na saída...
O primeiro assunto em pauta foi fazer ou não fazer nhoque naquela noite, a mãe de uma delas ser uma exímia cozinheira e a mãe da outra nunca estar em casa pra cozinhar. O próximo assunto foi o tempo das regras mensais de cada uma delas. Seguiu-se então uma bateria de coisas interessantes em pauta como estas... Cabelo da moça nova da produção, o namorado de uma que ia jogar futebol denovo ao invés de ir vê-la, regras menstruais denovo, uma das palavras mais repetidas foi "modess"... Pra mim é uma palavra mais feia que o pior palavrão que a gente possa dizer.
E eu lá, tentando dormir, sonhando com um fone de ouvido, tentando dormir, sonhando com uma arma com um enorme poder de fogo para matar a todos, tentando dormir e pensando que eu poderia estar em tantos lugares naquele momento...
Mas a pior parte foi a final... Uma das garotas estava combinando pelo celular com o namorado dele ir buscá-la no ponto. E foram, sem exagero algum, oito ligações. Eu disse "oito" ligações para tratar um encontro no mesmo, exatamente no mesmo lugar de sempre!!!!!! E eu me perguntava... Por que, em nome de Cristo, são necessárias oito ligações dizendo: Estou chegando, estou em tal lugar, estou indo, estou, estou... Aaaaahhhh, neste momento senti que a insanidade ia tomar conta de mim... E é claro que se eu tivesse surtado eu estaria errada e seria encaminhada a um psiquiatra. Anormal seria eu de me irritar com coisa alguma, não é mesmo?
Então respirei, contei até dez, cantei um mantra, orei, fiz uma promessa... E finalmente as duas horas haviam acabado.
Tudo o que eu queria era ir pra casa. E pra que? Para que a noite passasse muito rápido.
Para que hoje começasse tudo outra vez.
Mas hoje... Hoje eu não esqueci o fone.