sábado, 24 de setembro de 2011

Eu, o violão e a cozinha...

Nos últimos tempos não tenho mais horas de folga... Horas de folga são para lavar roupas, cuidar da casa, comprar comida, médico, essas coisas que gente pobre faz quando está fora do trabalho. Graças ao horário maluco e exaustivo do trabalho passo muito tempo sozinha pois meus horários não batem com o de ninguém. Então está sendo cada dia mais difícil conviver com as pessoas que amo. Tempos difíceis. Tempos de guerra. Tempos em que olhar para o futuro é o que justifica sair da cama todas as manhãs... Daqui um tempo eu mudo toda essa condição. Mas este não é o momento. A ordem é segurar a onda. A ordem é sorrir quando se quer chorar e seguir em frente. É fase. Como toda fase passa. Desespero não combina mais... E enquanto eu puder ter alguém para me ouvir e mesmo de longe estar por perto eu vou juntando força, força, força e vou indo. Uma hora eu chego lá. Mesmo porque a cada dia fica mais claro o que eu quero. E descobrir para onde vamos é com certeza o primeiro passo da jornada.
Todos tem suas fontes particulares de força e coragem, eu também tenho. Mas não imaginava que uma delas seria algo tão simples quanto sentar na minha cozinha com minhas pastinhas de cifras e... cantar.
É lá onde estou nas minhas luxuosas horas de folga... Tem quem cante no banheiro, eu canto na cozinha.
Com um violão emprestado sem marca, um set list mais eclético que Rock in Rio e tão eclético quanto meu gosto musical... Às vezes eu sento e canto duas horas seguidas e só então me dou conta de que o tempo passou. O público nunca aplaude, mas nunca critica e jamais pede alguma música que eu não queira cantar... Ah sim, eu também nunca ouço "Toca Raul"...
Há quem viva do passado "musical", há quem esteja engajado em dois mil quinhentos e noventa e quatro projetos musicais diferentes.
Eu não... Eu estou lá me apresentando pelo menos quatro vezes por semana na minha cozinha.
Acho tosqueira viver de passado musical. Ficar naquele sentimento nostalgico de "Então, cara, eu abri o show de fulano de tal, eu gravei com ciclano, eu tenho contato de...", ah não. Isso não. Que importa se você tocou para cinco mil pessoas se hoje você não faz nada melhor que suspirar pelos seus anos áureos? E pior que nem fez nada de significativo também... E fala como se houvesse tocado no Hollywood Rock de 96... Se você se sente assim por que não faz alguma coisa? Cara, faz qualquer coisa! Só não fica contando a mesma história pela milésima vez para a mesma pessoa do dia em que você tocou no palco de sei lá onde... Às vezes eu lembro de alguma história interessante dos dias das bandas. Mas não acho que eu era feliz naquela época e hoje não sou mais. Dias diferentes, fases diferentes. Não estou fazendo porque não quero, porque não sinto. Se sentisse e quisesse estaria fazendo. Posso querer denovo. Posso achar os músicos certos. Posso e basta. Mas música pra mim está tão além de comercializar, aparecer, sucesso...
E o cara dos quinze mil projetos... Não estou falando de músico competente que toca em várias parcerias ou que vive de música. Estou falando do camarada que toca por "diversão" em oito bandas diferentes e faz oito trabalhos furados. O negócio toma todo o tempo dele. Ele não estuda (nem profissionalmente e nem música), não passa um tempo de qualidade com quem importa, não está ganhando dinheiro, não cuida de si mesmo... Será que acredita mesmo no que faz ou será que apenas enche seu tempo livre com música porque esta é a única coisa que pode fazer? Música como fuga ou algo assim...
Ah, mas quem sou eu para falar? Sou só uma cantora de cozinha. Eu, o violão e a cozinha...
Hoje canto para lavar a alma, canto para lembrar quem eu sou, de onde vim, para onde vou. Canto porque viver às vezes dói. Canto porque viver às vezes é tão incrível que eu nem posso explicar. Canto porque sonho. Canto porque acordo. Canto porque rio, porque choro... Então canto.